Na última semana, o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (CONAR) instaurou representação ética contra ações publicitárias de bebida alcoólica especificamente nas redes sociais. Com o isolamento social, cantores substituíram os shows ao vivo pelas lives e, nessas apresentações, usam e abusam da cerveja. Gustavo Lima (foto) e a AMBEV foram advertidos pelo órgão regulatório, que interpretou que o cantor e a empresa estão incentivando o consumo de álcool por parte dos jovens e adolescentes – grande parte do público das lives nos botecos virtuais.
Renata Brasil Araujo, presidente da Associação Brasileira de Estudos sobre o Álcool e Outras Drogas (ABEAD), elogia a iniciativa do CONAR. “Notamos no Brasil uma grande exposição de jovens e adultos a conteúdos publicitários relacionados ao consumo de bebidas alcoólicas, que aparecem nos programas de televisão, filmes, videoclipes e redes sociais. Especialmente nas lives, os artistas fazem consumo excessivo de álcool, promovendo uma propaganda ostensiva deste tipo de produto. Vale lembrar que essas lives são acompanhadas por milhares de crianças e adolescentes”, alerta.
A presidente da ABEAD acrescenta que a indústria do álcool está aproveitando este momento de fragilidade emocional da população, causado pela necessidade do isolamento social, para aumentar a venda do produto. “As indústrias não estão levando em conta os cuidados preconizados pelo Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária para a publicidade de bebidas alcoólicas, colocando a saúde física e mental da nossa população em risco”, afirma.
Alessandra Diehl, especialista em dependência química e vice-presidente da ABEAD, chama atenção para a lucratividade de indústrias do álcool e do tabaco, cujas cifras são altíssimas. Elas destinam uma verba milionária para as propagandas que atingem em cheio os jovens, principalmente por meio da promoção de esportes e programas voltados para esse público. As próprias celebridades, que protagonizam as campanhas publicitária das marcas de cervejas, exercem forte influência entre jovens e adolescentes. “A exposição precoce a estas propagandas refletem na formação de valores a nas intenções de consumo e compras. Infelizemnte, a legislação no Brasil ainda não impede a publicidade de álcool direcionada a crianças e adolescentes”, ressalta Alessandra.
Alcoolismo mata de 3 milhões de pessoas por ano, diz OMS
Segundo relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS), publicado em 2018, o álcool mata cerca de 3 milhões de pessoas em todo o mundo a cada ano – representando uma em cada 20 mortes. No documento, a entidade aponta a relação entre consumo global de álcool e suas consequências adversas para a saúde: as bebidas alcoólicas matam mais pessoas do que a aids, a tuberculose e a violência combinadas.
“O álcool é a substância mais comumente consumida em abuso por crianças de 12 a 17 anos. E, apesar de ser uma droga lícita, encontrada nas prateleiras de supermercados e lojas de conveniência, é extremamente perigosa e, muitas vezes, letal. Os acidentes automobilísticos relacionados ao álcool são a principal causa de morte entre os jovens. Além disso, o consumo de bebidas alcoólicas geralmente contribui para homicídios, suicídios e afogamentos. Essas são as três principais causas de morte entre os jovens. O alcoolismo pode ser responsável ainda pela iniciação prematura das relações sexuais e desinteresse pelo estudo e notas baixas” argumenta Alessandra.
Outra preocupação da psiquiatra é que álcool também é a porta de entrada para outras drogas, principalmente quando olhamos para crianças mais velhas e pré-adolescentes. Por isso, o uso deve ser reprimidos pelos pais, autoridades da saúde e órgão regulatórios. “Estudos indicam que os jovens que bebem têm uma probabilidade quase oito vezes maior de usar outras drogas ilícitas do que aqueles que nunca bebem. Aqueles que começam a beber na adolescência têm duas vezes mais chances de sofrer uma lesão não intencional enquanto estão sob a influência do álcool”, informa a vice-presidente da ABEAD.