A propaganda na mídia de bebidas alcoólicas com graduação alcoólica igual ou superior a 0,5 Graus Gay-Lussac, que inclui a linha de cervejas, pode estar com os dias contados. A medida está pronta para ser votada pela Comissão dos Assuntos Sociais (CAS). O objetivo do Projeto de Lei da Câmara (PLC) 83/2015 é diminuir o consumo de álcool no País.
Pela atual redação da legislação, a restrição só é aplicada às bebidas com teor alcoólico superior a 13 graus Gay-Lussac, o que contraria a Constituição Federal (artigo 220, parágrafo 3º, II) e contribui para o consumo indevido de bebidas alcoólicas por crianças e adolescentes.
“Notamos que todo esse artefato da indústria da propaganda tem mesmo grande influência no poder de decisão das pessoas, principalmente no que diz respeito aos comerciais televisivos. Prova de que a estratégia vem dando certo, foi uma pesquisa feita com crianças há pouco tempo que indagava os pequenos sobre qual propaganda eles mais se lembravam. E a resposta foi surpreendente: não foram brinquedos ou doces que mais chamaram a atenção desse público na televisão. A propaganda que eles mais se recordaram era a de uma marca de cerveja que trazia um caranguejo que dizia “nanananan” e que encantou esse público”, comenta a psiquiatra Alessandra Diehl, que também é vice-presidente da Associação Brasileira de Estudos sobre o Álcool e outras Drogas (Abead).
Ela enfatiza que é muito difícil segmentar consumidores adultos e jovens, sem expor adolescentes menores de idade à mesma divulgação. “A exposição de crianças e jovens ao marketing atraente das indústrias de cerveja é particularmente preocupante. Por isso, defendemos uma abordagem preventiva para proteger esse público das técnicas poderosas de publicidade empregadas para vender mais cerveja”, destaca a vice-presidente da Abead.
Ela aponta que já existem publicações científicas que evidenciam o impacto negativo da publicidade no tocante ao uso do álcool pelos jovens. Um artigo publicado pelo World Health Organization alerta que álcool é comercializado por meio de técnicas de publicidade e promoção cada vez mais sofisticadas, incluindo a vinculação de marcas de álcool a atividades esportivas e culturais, patrocínios e colocação de produtos e novas técnicas de marketing, como e-mails, SMS e podcasting, mídias sociais, entre outras.
Propagandas de cerveja devem perder ‘brilho’ das estrelas
Outra iniciativa contemplada na proposta do relator do PLC 83/2015, Senador Styvenson Valentim (Pode-RN), é à divulgação comercial desses produtos apenas em pôsteres ou cartazes afixados dentro dos pontos de vendas.
O PLC 83/2015 ainda levou para a mesma emenda as restrições que deverão nortear as propagandas de bebidas alcoólicas: a divulgação desses produtos não poderá ser associada a personalidades do mundo dos esportes, à sexualidade e ao sucesso. Os comerciais também não poderão se dirigir ou incluir crianças ou adolescentes; tampouco anunciar propriedades medicinais, relaxantes ou estimulantes.
“Assim como a indústria do tabaco vendia a ideia que o cigarro estava ligado à liberdade, à virilidade, as indústrias de bebidas seguem adotando a mesma estratégia. “Os comerciais de cervejas estão ligados ao conceito de frescor, beleza e sensualidade. Para fazer essa associação, as estrelas desses comerciais são celebridades”, afirma Alessandra Diehl.
A proibição das propagandas de cervejas é uma briga antiga, porque fere o interesse das indústrias, que desejam consolidar algumas marcas e atrais novos consumidores. “Um abaixo assinado foi realizado em 2013, organizado pelo Ministério Público de São Paulo, batizado de “Chega de Propaganda de Cerveja na TV para Crianças e Adolescentes”. O objetivo era incluir a cerveja na legislação que regulamenta a publicidade de bebidas com maior teor alcoólico mas, infelizmente, não teve êxito”, recorda psiquiatra Alessandra Diehl.
Na opinião da especialista, o PLC 83/2015 é mais um avanço na criação de políticas públicas para inibir o consumo de álcool, principalmente por adolescentes. “As propagandas de cerveja são muitas e com ótima qualidade, criativas e sedutoras, do ponto de vista do marketing. Esses comerciais são direcionados principalmente para atrair mulheres, jovens e adolescentes, que são os novos consumidores dessa indústria”, finaliza Alessandra.