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Uso de maconha entre idosos: um velho novo problema?

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A cannabis é a substância psicoativa mais consumida do mundo. E se engana quem pensa que apenas o público jovem cai na marola da maconha, acreditando que a droga está associada a fins recreativos e que não causa dependência. Os idosos também estão entre os consumidores da droga, de acordo com diversas pesquisas científicas.

Os dados do National Epidemiologic Survey on Alcohol and Related Conditions (NESARC-III) de 2012-2013, mostraram que 3,9% das pessoas com idade ≥ 50 anos relataram o uso de maconha no ano anterior a pesquisa. Outro estudo importante, desenvolvido a partir dos dados da National Epidemiologic Survey on Drug Use and Health, com amostra probabilística (47.140 americanos com idade igual ou superior a 50 anos) e coletada entre 2006 a 2013, mostrou que o consumo de maconha nessa população aumentou significativamente em 57,8% para adultos com idades entre os 50- 64 anos, e 250% para os acima de 65 anos.

Para Alessandra Diehl, psiquiatra e vice-presidente da Associação Brasileira de Estudos Sobre o Álcool e outras Drogas (ABEAD), essa questão preocupante é tratada num capítulo intitulado “Uso de maconha entre idosos: um velho novo problema” da obra “Maconha: prevenção, tratamentos e políticas públicas”, organizado por ela em parceria com a pesquisadora Sandra Pillon, que acaba de ser lançado pela editora Artmed.

“O consumo de cannabis nesse grupo etário da população nas últimas décadas aumentou significativamente, superando as projeções e o recente crescimento observado em todas as demais faixas etárias”, relata a psiquiatra. Na opinião da especialista, o consumo de substâncias nas populações jovem e adulta são temas já bem documentados em estudos, mas ainda há lacunas nas pesquisas científicas que abordem o fenômeno do consumo de maconha entre os idosos.

Segundo ela, existem algumas possibilidades que talvez possam justificar estas taxas crescentes de consumo de maconha entre os idosos. Uma delas entende que as pessoas que vivenciaram a adolescência em momentos em que as drogas eram populares e amplamente disponíveis foram os mais propensos para o uso de drogas e, possivelmente, continuaram usando. “Os indivíduos nascidos entre os anos de 1946 e 1965, os babies boomers, apresentaram taxas mais elevadas de uso de substâncias durante a juventude em comparação à população de cortes anteriores. Uma parte significativa dessa geração continuou a usar drogas e, atualmente, essas pessoas têm mais de 50 anos”, argumenta Alessandra.

Ela relata que, outra possibilidade, pode estar ligada à legalização do uso recreativo em alguns países e estados americanos. Esse fator contribui para a diminuição nas percepções dos riscos associados ao uso de maconha e, portanto, apesar dos efeitos adversos relatados, muitas pessoas acreditam que a cannabis pode ser uma terapia alternativa ou complementar importante. “Em relação ao “uso medicinal”, os resultados de estudos incipientes são muitas vezes inconclusivos e diversos nesta população. Muitos pacientes mais idosos agora solicitam o uso da cannabis para o tratamento das morbidades e consequências adversas relacionadas, como dor crônica, por exemplo. Compreendendo que a grande parte da população e uma proporção ainda mais proeminente de usuários dos serviços de saúde, os idosos constituem um grupo-alvo que também têm feito a requisição de “tratamento” com cannabis medicinal em outros países”, diz Alessandra.

Vale lembrar que a população geriátrica tem maior probabilidade de apresentar múltiplas comorbidades e está sujeita a polifarmácia. O uso de maconha, medicinal ou recreativo, complica o quadro com efeitos colaterais aditivos do sistema nervoso central. Os transtornos relacionados ao uso de substâncias implicam em consequências biopsicossociais na população idosa, incluindo prejuízos cognitivos, questões de saúde como queda, problemas respiratórios e delirium, sociais e enfraquecimento funcional. No entanto, a identificação do uso de maconha entre os idosos tem sido uma barreira entre os serviços de saúde, sendo que muitos usuários nunca recebem tratamento específico, por uma série de razões, sendo a mais notável a falta de detecção.

A psiquiatra alerta ainda que, à luz da escassez de evidências clínicas e do aumento das solicitações de informações ou do uso dos pacientes idosos por canabinoides medicinais, irá requerer uma abordagem clínica pragmática. “Precisamos estabelecer um diálogo racional com pacientes idosos e seus familiares, destacando a importância da criteriosa avaliação e do cenário atual de evidências científicas sobre o uso da maconha com fins medicinais”.  

Aumento da expectativa de vida X saúde pública

Outra situação que deve ser levada em conta é o aumento da expectativa de vida e da inversão da pirâmide demográfica. No Brasil, a população idosa cresce em ritmo acelerado e passou de 19,5% no período entre 2012 e 2017. Acredita-se que, até 2060, os idosos vão chegar a 81 anos e representar 32% da população brasileira – sendo que em 2013 ocupavam apenas 13% da pirâmide demográfica. Os dados são do IBGE.

“É consenso que os idosos usam drogas prescritas ou não, ilícitas ou legais, os quais podem ser catalisadoras ou agravantes de outras doenças mentais. Esse é um problema grave, sobretudo se consideramos que a previsão é de 15 milhões de idosos com transtornos psiquiátricos para 2030 em decorrência das mudanças na pirâmide demográfica”, finaliza Alessandra Diehl.

Serviço: O Livro “Maconha: Prevenção, Tratamento e Políticas Públicas”, das autoras Alessandra Diehl e Sandra Pillon, lançado no último mês de setembro de 2020, já está disponível para pré-venda e maiores informações de conteúdo no link: https://busca.grupoa.com.br/search/?query=maconha.

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